sexta-feira, outubro 03, 2008

O que é mulher para você?

Com esta pergunta em mente, resolvi mergulhar no maravilhoso mundo dos cuecas para buscar uma resposta. Para os que não sabem, o mundo dos cuecas é formado exclusivamente por homens, que primam pelo corporativismo descarado. Os cuecas tem o ciclo de vida regido basicamente por três coisas: sexo, comida e sexo. Não necessariamente nesta ordem. Fiz questão de falar com cuecas de todos os tipos, até mesmo aqueles em que a opção sexual não permite um contato físico maior do que uma hidratação. Ou tintura. Ou escova.
E são pelos tipos de escova que podemos começar a entender o universo feminino. Escova marroquina, tailandesa, progressiva e as emblemáticas escova inteligente, que não sabemos como o QI dela foi medido e a definitiva, que dura exatos seis meses. Não importa se é preciso passar três dias com formol na cabeça, o negócio é colocar o rosto entre parênteses. De acordo com os profissionais de salão, as mulheres são criaturas claramente masoquistas, que são capazes de qualquer coisa para ficarem mais bonitas. Depilação com cera quente para fazer virilha cavada, meia perna e contorno, além da sobrancelha retirada na pinça e intermináveis demão de tinta nos pés e mãos. São quase duzentos reais gastos em sofisticadas técnicas de tortura. E isso tudo para correr o risco de ter que dividir a conta ou ainda ser preterida por um jogo do Campeonato Brasileiro.
Os cuecas ligados ao mundo tecnológico dizem que a mulher é o melhor hardware com o pior software. Não raros são aqueles que defendem que o Windows é um programa feminino e que suas complicações são uma espécie de TPM digital. O que eles não conseguiram explicar é porque que continuam a insistir no mesmo sistema. Comodismo, talvez. Mas que graça teria a vida sem aquela mensagem “Este programa não está respondendo e deverá ser fechado”.
Já os que vivem de enfrentar o trânsito nosso de cada dia, reclamam que as mulheres não sabem dirigir. Não é o que as seguradoras acham, pois cobram cerca de vinte por cento a menos das mulheres. Eles reclamam que mulher não sabe estacionar. Mas convenhamos, são três espelhos à disposição. Qual a mulher que resiste a dar uma conferida na maquiagem durante uma baliza?
Os que usam cuecas por baixo de batinas ou ternos de gosto duvidoso, acham que as mulheres são excelentes donas de casa. São figuras sagradas, quase santas. Esquecem no entanto que a mãe é uma mulher como outra qualquer. A mãe que passou Hipoglós nas bundas religiosas é a mesma que já desejou outros homens, além daqueles que eles conhecem como pai.
Para aqueles cuecas que estudam a mente humana, as mulheres tendem a idealizar os homens e por isso sofrem com as desilusões amorosas. De fato, isto é verdade. Mas custava ter ligado no dia seguinte? Ou ter reparado no corte de cabelo novo? Ou mesmo ter prestado atenção naquela história sobre a ex-melhor amiga?
Mulheres são complicadas. Mulheres não são corporativistas. Mulheres agem como uma montanha-russa sem freio. Mulheres são deliciosamente imprevisíveis. E se você não é homem o bastante para encarar, é melhor pendurar a cueca.

Bruno Buaiz

terça-feira, junho 24, 2008

Roliude

Um último suspiro me separa do emaranhado de barracas que oferecem produtos capazes de alçar simples mortais a condição de consumidores de grifes internacionais. Imensas sacolas de plástico escondem sonhos de uma parcela da população que se espelha em ídolos tão instantâneos quanto um Miojo, na busca por um estilo de vida só acessível graças aos colegas de profissão do Capitão Gancho. Estou diante do camelódromo.
Uma vez preparado, mergulho naquele universo paralelo, onde a lei do livre comércio é levada às últimas conseqüências. Imediatamente me vem a cabeça aquelas incríveis imagens, misteriosamente captadas, que nos revelam o interior de um formigueiro. Definitivamente estou imerso num formigueiro humano, onde milhares de pessoas questionam a cada esbarrão a famosa lei da física, que garante que dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço.
Diferente das pessoas que procuram ali grifes de fama mundial, e diga-se de passagem com nomes impronunciáveis para os próprios vendedores, busco filmes clássicos, vendidos a preço de banana em barracas que repassam o acervo de locadoras que sucumbiram à pirataria.
Não demora muito e minha atenção é laçada por uma estratégia de marketing tão sofisticada quanto uma bolsa Louis Vuitton paraguaia.
- Tááááá tudo em promoção! Só crássicos de Roliude!
Ainda atordoado pelo grito, mas definitivamente interessado na mercadoria,
posto-me em frente a um senhor de aparência simples e sorriso aberto.
- Boa tarde....
- Boaaaaa tarde, amigoooo!
- Não precisa mais gritar. Estou na sua frente...
- O amigo tem toda razão. Pode ficar à vontade, viu? Qualquer coisa meu nome é Charles. Em homenagem ao Chaprin. O amigo conhece?
- Já ouvi falar...
- O amigo tá procurando algum filme?
- Um do Chaplin seria bom.
- Quem?
- Chaprin...
- Ah. Tem O Garoto. Serve?
- Serve. Quanto é?
- Leva mais dois e pega a promoção.
- Que promoção?
- Éééééééée três por quinze!
Minutos depois sou cuspido de volta à rua, com menos quinze reais na carteira e carregando três clássicos do xará do Seu Charles. Sem dúvida, a Roliude é aqui.

Educação a cabo

João Paulo havia ignorado os pedidos da mãe e agora estava postado de frente ao pai, que agora via-se obrigado a dividir a atenção entre o encanamento da pia e o filho.
- Pai, me ajuda numa coisa?
- Agora eu tô ocupado com um vazamento...
- Mas vc consegue falar.
- Consigo, mas eu tenho que me concentrar aqui. Não dá para
fazer duas coisas ao mesmo tempo.
- A mamãe consegue.
- Então pede para ela te ajudar.
- Eu pedi, mas ela está costurando a sua calça, ninando a
Carlinha e vendo novela. Tudo ao mesmo tempo.
- Tá bom. O que você quer?
- O que é microfilme?
- É um filme muito pequeno.
- Como assim?
- É como se fosse um filme fotográfico, só que menor.
- Filme fotográfico?
- É o filme que se usa para tirar foto.
- Mas a câmera não é digital?
- Depois eu te explico melhor. Era só isso?
O menino consulta um pequeno papel amarrotado que levava no
bolso da calça de moletom.
- Não. O que é desconexão?
- É quando uma coisa deixa de ser conectada.
- Como assim?
- Sabe quando o pai está fazendo um trabalho na internet e de
repente pára tudo? Isso é porque o computador se des-co-nec-tou da internet. Desconexão. Entendeu?
- Hum. Achei que isso fosse "puta-que-pariu".
- Que isso, Pedrinho? Isso é uma palavra feia!
- Mas você sempre fala quando isso acontece...
- Não importa. Criança não pode falar isso. Acabou?
- Não. O que é pós-escrito?
A vermelhidão nas bochechas do pai já ilustrava uma certa
irritação com o questionário do filho.
- É uma coisa que foi escrita depois de outra coisa.
- Como assim?
- Ai, meu deus! De onde você tirou essas palavras todas?
- Da TV a cabo. Microfilme e desconexão eu escutei
no Discovery Channel. Pós-escrito eu escutei no History Channel. E tem mais...
- Ah, é? Vem aqui comigo.
O pai abandona o encanamento vai esbaforido na direção do
telefone. Disca rapidamente sob o olhar curioso do filho.
- Pai, o que...
- Shiii.
Após 15 minutos de um silêncio repleto de tensão, o pai é
finalmente atendido.
- Bem vindo ao atendimento NET. Ruth de Souza falando. Em
que estarei podendo ajudar ao senhor?
- Na verdade é o meu filho que está precisando de ajuda.
- Não entendi, senhor.
- Vou deixar ele mesmo falar com você. Filho, a moça do
telefone vai te ajudar.
- Alô, moça?
- Pois não?
- O que é Biofísica e tridimensional?


Bruno Buaiz

quinta-feira, agosto 24, 2006


Domingo no Rio

Este foi um domingo atípico para o Seu Jorge. Ele não trabalhou. Acabou deixando sua clientela com sede. Pela primeira vez em 5 verões ele não desfilou seu largo sorriso pela areias da praia. Seu Jorge vendia mate. Na verdade Seu Jorge vendia mesmo era o seu sorriso. Era capaz de alegrar uma pessoa só de olhar para ela. A decisão por comprar o mate era apenas um impulso secundário.
A idéia de vender mate nasceu junto com seu primeiro filho, batizado pelo pai de Martin. Sobre a escolha do nome ele dizia:
- É em homenagem ao Martin Luter Quingues - dizia num inglês cheio de ginga.
Seu Jorge era analfabeto. Analfabeto e negro. Tão negro que atingia diversas tonalidades de azul toda a vez que o sol castigava-lhe a pele e o corpo suava de forma impiedosa. Mas isso nunca impediu Seu Jorge de conhecer o mundo. Como não lia, ele vivia o mundo através de um pequeno rádio.
- Rádio não. Isso é um Uóiquimam! Da Soni! - fazia questão de lembrar.
Seu walkman não sabia o que era música. Seu Jorge escutava apenas notícias. Escutava até mesmo a Hora do Brasil. As notícias davam a ele a dimensão do mundo. Dono de uma memória invejável, Seu Jorge era capaz de guardar em detalhes as principais notícias da semana e transmiti-las para os clientes mais assíduos. Muitos deixaram de ler o jornal aos domingos, pois contentavam-se apenas com o Boletim do Seu Jorge, como era conhecido.
Mas naquela manhã de domingo, traído por uma pilha velha, Seu Jorge não escutara o rádio antes de sair para o trabalho, como fazia todos os domingos. A aparente paz de uma simples manhã de domingo escondia uma iminente invasão policial. Um policial havia sido morto durante a madrugada, perto da favela onde Seu Jorge fixou residência. O desejo de vingança nascia junto com o dia.
Seu Jorge era favelado. Mas como a maioria dos favelados, era apenas um trabalhador invisível aos olhos do mundo. Um rápido beijo no santinho colado na geladeira servira-lhe de café-da-manhã. O som da porta de casa batendo foi o penúltimo som que Seu Jorge ouviria naquele domingo. O último foi um estampido seco. Um tiro.
Horas mais tarde a rádio de notícias preferida de Seu Jorge noticiava a sua morte. Bala perdida, diziam. Mas sabemos que bala perdida é aquela que encontra abrigo num muro de concreto. As que ceifam a vida de uma pessoa inocente apenas cumpriram o seu papel. Afinal, balas são feitas para matar. E mataram neste dia mais do que o boletim de notícias do Seu Jorge. Mataram a alegria de um domingo.


Bruno Buaiz

segunda-feira, junho 12, 2006

A D.R. e o Homem

D.R. Para quem não sabe, D.R. é "discussão de relacionamento". D.R. não é briga. D.R. é D.R. Briga é quando duas pessoas acham que estão com a razão e tentam provar por meios estereofônicos que a sua razão é melhor do que a outra. A D.R. é como um julgamento em flashback, onde você já começa culpado e vai descobrindo depois o porquê. É o tipo de coisa que está além da compreensão masculina. O pior é que o homem só percebe que é vítima de uma D.R. meia hora depois do início do encontro. É quando o sujeito nota que, de uma hora para outra, o protocolo de comunicação com a sua namorada mudou. Ao invés de recorrer às palavras, sua namorada agora quer ser entedida de uma forma menos convencional seja através de uma trincada com o dente molar ou um ligeiro movimento de córnea. Sim, meu amigo, não adianta reclamar, se a "conversa" está nesse estágio, você está atolado numa autêntica "Discussão de Relacionamento". Daí pra frente você terá que cumprir as três etapas clássicas de uma D.R.: a investigação, a negação e o perdão.
Na etapa de investigação, você vai perguntar de 4 a 37 vezes, em média, o que aconteceu para sua namorada estar tão quieta. Ela, por sua vez, irá dizer de 4 a 37 vezes que não aconteceu nada. O problema é que quando uma mulher diz "não aconteceu nada" no fundo ela quer dizer "aconteceu, aconteceu sim! É só deixar de ser preguiçoso e dar uma chegadinha no meu cerebelo, imbecil!". Nesses momentos de tensão em que existe um prenúncio de esporro é interessante observar como alguns pontos do rosto da sua namorada sofrem ligeiras deformações. É o caso das narinas que naturalmente dilatam fazendo com que você finalmente acredite na tese de que o homem descende do macaco. A partir daí, o nariz da sua patroa cria vida própria e as palavras são trocadas por suspiros audíveis num raio de aproximadamente 150 metros.
"O que foi?"
"(suspiro)"
"Me conta... Se você continuar assim eu não vou ter como saber..."
"(suspiro)"
"Se abre comigo..."
"(suspiro)"
"Meu amor, não quero ficar insistindo nisso...."
"(suspiro)"
Você só deve parar de perguntar depois de contar de 3 a 5 suspiros. Esta é mais ou menos a duração da série suspiral. Mas não se preocupe, pois você saberá quando a série chega ao último suspiro. Se estiver em um restaurante, é só reparar nas mãos dela, que a esta altura estará espetando uma fatia de pizza como se fosse um boneco de vodu ou rasgando a toalha de mesa. É importante notar, no entanto, que o último suspiro, também conhecido como suspiro-mãe, é peça fundamental na D.R. É ele quem vai te jogar para a segunda etapa (negação).
Na etapa da negação você vai tentar lembrar a cagada que você fez ou falou nos últimos 30 dias úteis e negar de forma veemente. Bom, como a memória masculina é fotográfica e basicamente aplicada em fragmentos do corpo feminino alheio, você não vai lembrar. Aí, é só fazer aquela cara natural de quem foi parado numa blitz e tem um cadáver na mala e esperar pelo movimento de sua namorada que, percebendo a sua incapacidade em se tornar um médium, vai lhe dar algumas pistas...
"(suspiro) Amor, lembra do dia em que estávamos saindo daquela churrascaria e te perguntei se estava gorda?"
Amigos, uma dica: quando sua namorada ou esposa te faz esta pergunta, não importa sua resposta, você invariavelmente estará fudido. Entendam de uma vez por todas, não existe resposta correta para esta pergunta. Você tem que criar uma situação que desvie a atenção dela do assunto. Se vocês estiverem andando na rua, procure um bueiro aberto ou se jogue na frente de um carro. O que vier primeiro. Tanto faz. Se você estiver dirigindo, bata o carro. Ou atropele alguém. O que vier primeiro. Tanto faz. Agora, se você ousar responder, vai estar plantando a sementinha da D.R.
"Meu amor, não acho você gorda...."
"Oi? Não ME ACHA GORDA? Você está dizendo que sou gorda mas que você não acha? É isso? O mundo inteiro acha, menos você?"
"Não foi isso que falei..."
"Ah, então fala mais alto porque eu ACHO que a gordura está me deixando surda..."
"Não...Peraí... Veja bem....."
"Ah, olha só. Deixa pra lá... Você já respondeu mesmo..."
"Mas eu não falei que você está gorda! Você é linda, meu amor..."
"E eu lá quero ser linda? Eu quero ser magra! Idiota..."
Esta fase pode durar alguns minutos ou algumas horas. Vai depender da sua disposição em tentar justificar sua resposta no dia da pergunta. Mas não se preocupe, a sua gafe sempre será lembrada por ela como se estivesse numa mesa redonda, com direito a replay, câmera lenta e tira-teima. E também não adianta tentar minimizar seja lá o que foi que disse, pois todas as amigas já acharam um absurdo o que você supostamente falou e ainda que você não saiba, já foi julgado e condenado por um tribunal de calcinhas em fúria. Bom, amigo, nada mais lhe resta do que ficar calado e ouvir sua sentença. O ciclo da DR chega então ao seu momento conclusivo...
O perdão. Muita calma nesta hora. Nesta fase você precisa medir muito bem as palavras. Qualquer descuido pode ser fatal. Na verdade, só existe uma palavra para ser utilizada: "desculpa". Mas cuidado com a repetição. Seja criativo e utilize todas as variações gramaticais em torno da palavra "desculpa", de forma randômica e em pelo menos 4 idiomas diferentes. A expressão corporal também é muito importante nesta fase e deverá ser utilizada em conjunto com a seqüência de "desculpas". Como ela estará pouco propícia a qualquer tipo de contato corporal, a medida que você se aproximar, ela irá bloquear suas mãos com a agilidade de um mestre kung-fu. Para vencê-la, utilize a milenar posição do polvo-em-pêndulo. Movimente o seu corpo de um lado para outro, como um VJ da MTV, para dificultar o bloqueio. Em seguida, utilize o velho truque da multiplicação de braços, muito usado na sua adolescência para abrir sutiãs, para conseguir abraçá-la. Não tem erro. Uma vez abraçada, sua D.R. estará oficialmente no fim.
Agora, aproveite seu prazo de garantia de 6 a 9 dias úteis, que é o tempo médio entre D.R.s e relaxe. Boa sorte e lembre-se: relacionamento sem D.R. é como felicidade no casamento , só existe na sua imaginação.
THE FIM